quinta-feira, 19 de junho de 2014

lapsos: conversas com Clarice e Llansol...




"Eu transitava essa linha tênue entre a chegada e o mais além. Mas
queria mais e suspeitava que para isso era preciso perder...  Até então
escrevia ali, no limite da mentira."



"Pois como poderia eu dizer sem que a palavra mentisse por mim?"


“a língua é uma impostura. Mas é possível, em algum momento, atingir a
linguagem, a língua sem impostura. É isso o que o meu texto quer.
Quando me perguntam se escrevo ficção, tenho vontade de rir.
Ficção? Personagens que acordam, dormem, comem? Não, não tenho
nada a ver com isso. Para mim, não há metáforas. Uma coisa é ou não
é. Não existe o como se. O que escrevo é uma só narrativa, que vou
partindo, aos pedaços.”


"Para além da mentira não há verdade, há isso."

sábado, 14 de junho de 2014

da nudez I

com tudo aquilo que não tinha
ela se fez presente:

lhe deu as costas

ampliada em parênteses
desejava uma falta mais inteira que a sua

terça-feira, 3 de junho de 2014

A menina do penso quebrado

A menina tinha o penso quebrado! Nasceu assim, não sabia explicar, não sabia nem o que era isso e se espantava com as perguntas. Aliás, se espantar era algo que sabia muito bem... De resto, não sabia de quase tudo. Deixava cair o queixo e abria os olhos bem grande. De penso quebrado via que não há mistério no rabo das lagartixas. Mas há beleza ou feiura e o número de piruetas que ele dá antes de jazer inerte no chão. Via que o amarelo era amarelo, o azul era azul e que tinha gente que chamava o verde-água de azul-piscina e era isso mesmo, variâncias de olho... De penso quebrado, brincava de roda e de pique-esconde, comia manga e chocolate se lambuzando sincera e sem metafísica. E ela não precisava de penso pra saber que ficava às vezes triste e que tinha medo de escuro. Entender não entendia de nada não, mas existia assim, acreditando...

sábado, 24 de maio de 2014

domingo, 18 de maio de 2014

falta na memória

Bananeiras se ampliavam para selva escondendo o mundo. Há vida além do medo... Caqui, uva, limão, jabuticaba, coelho, gambá. E um sussurro rondando, sempre à espreita... Escadas anunciam o caminho. Para além delas, mais mundo, mais medo. Malas engolem crianças inteiras. Portas disfarçadas revelam encanamentos. A água flui abrigada entre as paredes, o fluxo em algum lugar por trás dos ombros. Entrava pela janela, subia nas portas. Não se pode pisar nas linhas entre os azulejos, jamais! Degraus são pulados num impulso: ...dois, três, quatro, cinco! O destino alçado desafiando a casa... Descer sempre foi mais fácil. Lá em cima, a travessia vinha antes da luz. Um labirinto à espera, o desejo escondido no ponto mais alto. Derrubava o medo sem abrir os olhos. O vazio abandonado sob a mesa chamava o nome do pai...

domingo, 4 de maio de 2014

Tabuleiro francês

Cuidadosamente eram desenformados nos tabuleiros de todos os dias. Sabores escolhidos com atenção... Para curar existências angustiadas. Receitas diferentes, todas com a mesma forma. Talhada no inconsciente devidamente controlado. As semanas passavam doces e ternas pelas mãos de quem sempre sabe o que é melhor. Pessoas controladas e encaixadas no tabuleiro de todos os dias. Peças escolhidas com atenção... Um jogo e suas regras: cada coisa em seu lugar, um lugar para cada coisa. Nesse mundo bem resolvido, Saint-Exupéry é mais que um consolo para o abandono...

"–A culpa é tua –disse o principezinho– Eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse..."

É a isenção perfeita. E naquela casa a perfeição seria sempre mais importante que chocolate.

domingo, 27 de abril de 2014

do papel (,) do corpo


De repente havia um corpo!... Corpo-objeto de desejo, desvendado por outras mãos... As minhas um dia se ocupariam da escrita e tentariam criar um corpo próprio. Assumi o corpo como linguagem, existindo a partir da palavra... Escrever para compor um corpo. Incorporar... Porém há um corpo anterior que risca o papel. Que corpo é esse que escreve, mas não se inscreve? Um corpo que vibra, que arrepia, que pulsa... O corpo respondia a outro corpo. Quando esse outro se assemelhou ao meu foi um reconhecimento. Pegar, encostar, sentir. Com-tato. Olfato, audição, visão, paladar. Corpo sensível, formado de sentidos. Este corpo observava o chão escuro pedindo mergulho, quase um abismo. Um pé de cada lado. O último degrau, pesando o corpo para trás, faz questão de afirmar a gravidade. O impulso vem de uma impossibilidade. Mas esse impossível pede existência. Tentativas de se inscrever no espaço. Momento de perder-se... Esquecer de si neste instante-já, fugidio. O inesperado sangra. Grita sua insatisfação. O corpo adoece! Susto... Então o corpo nos escapa? Medo. A morte só existe porque há um corpo. E a vida? Há vida através do corpo, a-pesar do corpo... O meu encanto é quase um ato de resistência frente à dor. “Você não vai me impedir de ser” “Você não vai me impedir de me amar pelo que eu sou, mulher...”A morte é demasia do corpo, é corpo em plenitude. A vida não tem contrários. 

sábado, 19 de abril de 2014

Para Eros se lembrar da mãe II

Essa história se desenvolve em torno de uma questão: "presente ou presença?" Não há intuito de se responder à questão, mas na tentativa há um processo que se (des)construiu continuamente...


1º ato, ano 1, quarto: Meia noite e uma ideia adolescente.
...

2º ato, ano 2, outra cidade: Um fim antecede o início.
...

3º ato, ano 3, muro: Caneta, Clarice, cerveja e um amor imaginado.
...

4º ato, ano 4, por aí: 
.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

(...)

Sempre haveria um desconhecer por trás das coisas... Algo que escapa, esquiva pelas frestas e segue por aí com vontade alheia e própria... Um não-saber que transita o tempo... A lacuna, o não-lugar, o através... Talvez daí viesse a poesia. De um real que é anterior e além... Que tenta se mostrar, mas é sempre incompleto... Marcando um outra vez que nunca é o mesmo, mas repete... E não cessa.