domingo, 30 de setembro de 2012

Fluidificar-se

Ela nunca tinha olhado para a água daquela maneira: encantou-se!

Resolveu que iria guardar cada gotinha... Como caía em pingos era fácil, bastava posicionar os baldes e esperar que enchessem. Com o tempo, porém, a água começou a vir em grandes quantidades, contínua. Os baldes passaram a serem trocados com cada vez mais frequência e ela precisava ficar atenta a eles.

Foi então que teve uma ideia: começou a construir uma piscina no meio do cômodo. Assim poderia armazenar com mais facilidade, lhe pouparia tempo.

Um dia a piscina começou a lhe parecer pequena. Resolveu tampar as janelas do cômodo com cimento deixando a água contida pelas paredes. Para que ela mesma pudesse entrar e sair do local, fez uma pequena abertura próxima ao teto. Até que não houve mais jeito: abandonou o cômodo e deixou que a água o ocupasse por completo.

Certo dia as paredes racharam e no minuto seguinte foram completamente rompidas deixando escapar a água toda. Assistia à cena do lado de fora desesperada. Tentou conter algo com mãos: em vão... Como cachoeira a água fluía livre, fora do seu controle, arrastando-a!

Em pânico, sorvou quantos goles foi capaz, afundou e deixou-se levar.

Enfim, transbordara.



Depois de um dia inteiro de apostos, entretanto’s, pronomes relativos e terceiras pessoas do singular...

Encontrei no armário seus corações guardados!

Saboreei um por um com calma e eles me adoçaram trazendo parênteses, plurais, reticências e pretéritos. Mais que perfeitos!

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

MISSÃO

Sento na cadeira e olho a folha em branco. “Vamos lá. É só escrever.” Segundo o dicionário, 'dizer por escrito', 'encher de letras'. Preciso encher de letras o papel branco. Branco... Em branco. Minha mente está em branco, ou seja, falta de idéias. Segundo o dicionário ideia é 'uma representação que se forma no espírito'. Estranho, não entendo o significado. Será que quer dizer que não tenho espírito? Espírito é igual alma? Talvez eu tenha alma branca, por isso não sai nada. Acho que isso não vem ao caso. Tic Tac. Passou uma hora. Uma folha já foi pro lixo. Outra folha. Letras, artigos, conjunções, pronomes, verbos... Orações subordinadas substantivas. Nunca entendi pra quê tinha que saber classificá-las, não servem para nada agora. Tic Tac. Duas horas. Levanto. Melhor beber uma água. Água não, conhaque! Conhaque parece ser bom para ajudar a criar. Vinicius de Moraes bebia uísque. ‘Uísque é o cachorro engarrafado’ ele dizia. Não gosto de uísque. Nem de cachorros. Nem desse texto, pra dizer a verdade. Mais um pro lixo. E outro. E mais outro. O lixo no lixo. Ironia? Umas das definições do dicionário para lixo: ‘sobra’. Na verdade não sobra nada. Só falta. Criatividade, idéias, auto estima. Tic Tac. Já nem sei mais quantas horas se passaram. Também falta tempo. Os dicionários costumam ter, no mínimo, 17 definições diferentes para Tempo. Mas nada como ‘algo que sempre falta quando você precisa’. Se bem que isso pode ser muita coisa. Há grande chance de significar dinheiro se você for estudante universitário morando em outra cidade. Tempo poderia ser ‘aquilo que sempre que você precisa de muito tem pouco e quando quer pouco tem sobrando’. Confuso. Pensar nisso é perda de tempo. Vamos voltar ao foco. Tic Tac. Embola e joga fora. Tic Tac. Rasga e joga fora. Tic Tac. Rabisca e ... joga fora! Opa, acho que apareceu alguma coisa. 1, 2, 3, 4 ... 18 linhas! Já deu. Tchau.