Meu olhar pára nas suas mãos e fica. Um livro surrado de
capa vermelha, você emoldurada entre a parede e a cômoda, seus lábios distantes
e embaçados se movendo em versos mudos e, talvez, escolhidos.
São 2h da manhã e eu folheio mais de 400 páginas tentando ouvir
sua voz que ficou suspensa em algum lugar que não me lembro. Falha na memória? Não... Memória pedinte, viva, chamando pra ser inventada.
Essa memória é um “ainda”. Advérbio de tempo, modificando as circunstâncias
da (não)ação. Querer é verbo? O querer se modifica sozinho, atropela
vírgulas, pontos, parágrafos, mas com o ainda aceita nossas reticências... O ainda é meu permanecer no tempo. O ainda é uma alternativa para o querer
inquieto...
Volto ao mistério da memória. Continuo
folheando até a reinvenção dos seus versos mudos, ocupo o lugar do silêncio e escolho(será?...), página 106:
“cabeceira
Intratável.
Não
quero mais pôr poemas no papel
nem
dar a conhecer minha ternura.
Faço
ar de dura,
muito
sóbria e dura,
não
pergunto
“da
sombra daquele beijo
que
farei?”
É
inútil
ficar
à escuta
ou
manobrar a lupa
da
adivinhação.
Dito
isto
o
livro de cabeceira cai no chão.
Tua
mão que desliza distraidamente?
sobre
a minha mão”
(Ana
Cristina César)
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