sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

AINDA II

Meu olhar pára nas suas mãos e fica. Um livro surrado de capa vermelha, você emoldurada entre a parede e a cômoda, seus lábios distantes e embaçados se movendo em versos mudos e, talvez, escolhidos.

São 2h da manhã e eu folheio mais de 400 páginas tentando ouvir sua voz que ficou suspensa em algum lugar que não me lembro. Falha na memória? Não... Memória pedinte, viva, chamando pra ser inventada. Essa memória é um “ainda”. Advérbio de tempo, modificando as circunstâncias da (não)ação. Querer é verbo? O querer se modifica sozinho, atropela vírgulas, pontos, parágrafos, mas com o ainda aceita nossas reticências... ainda é meu permanecer no tempo. O ainda é uma alternativa para o querer inquieto... 

Volto ao mistério da memória. Continuo folheando até a reinvenção dos seus versos mudos, ocupo o lugar do silêncio e escolho(será?...), página 106:

“cabeceira

Intratável.
Não quero mais pôr poemas no papel
nem dar a conhecer minha ternura.
Faço ar de dura,
muito sóbria e dura,
não pergunto
“da sombra daquele beijo
que farei?”
É inútil
ficar à escuta
ou manobrar a lupa
da adivinhação.
Dito isto
o livro de cabeceira cai no chão.
Tua mão que desliza distraidamente?
sobre a minha mão”
(Ana Cristina César)

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